Leia o Segundo Capítulo de OEDM !
Capítulo 2
Mosteiro da Colina
Elias acorda
de repente. O mesmo sonho! Senta-se na cama e acende o abajur.
“Preciso falar
com dom Giovane” – pensa ele – “Preciso contar tudo”.
Logo de manhã,
Irmão Elias já aguardava a chegada de Dom Giovane numa saleta do mosteiro. Ele
entra e fecha a porta. Depois de alguns longos minutos, Dom Giovane sai em
direção à biblioteca. Demora um pouco e chega trazendo um caderno com capa de
couro nas mãos, fechando logo a porta atrás de si.
– Está aqui. –
entrega o caderno para o monge – Esse é o caderno do prior, onde ele escrevia
tudo sobre o espelho.
– Como o
senhor conseguiu? – espanta-se, Elias.
– Há um tempo
eu também tive esses sonhos, mas depois parou. Na época fiquei muito intrigado
e comecei a pesquisar. Achei esse caderno muito bem guardado aqui na biblioteca.
Li, estudei... – silencia-se, pensativo.
– Então o tal
lugar existe? Está sendo ameaçado, mesmo?!
– Pode ser...
Só sei que a história é real, aconteceu há séculos atrás... Neste mesmo Mosteiro,
antes das reformas. O povo da cidade vivia tranquilo e o Mosteiro era celeiro
de santas vocações! Até que... começaram desavenças entre os monges; sutilmente
entraram as maledicências, as reclamações, os relaxamentos espirituais e a
cidade foi ficando muito violenta. Isso tudo foi acontecendo lentamente, até
que tomou um corpo imenso e complicado. Muitos monges saíram do Mosteiro; dos quarenta
que haviam, sobraram apenas seis. O prior foi nomeado quase que em caráter de
emergência e não lhe deram chances de recusa. Ele sabia que algo de errado estava
acontecendo para que, em pouco tempo, o Mosteiro mais bem conceituado e frutuoso
da região, tivesse se tornando um local de queda e deserção. Ele passou quarenta
noites em oração profunda, pedindo a Deus que lhe revelasse a origem dos
problemas, para que ele pudesse reerguer o Mosteiro e entregar-Lhe ainda mais
vocações do que aquelas que haviam se perdido. Foi
então que, na noite do quadragésimo dia, o monge foi visitado por um Anjo que
lhe entregou um pequeno espelho com as devidas instruções. Essas instruções
foram cuidadosamente anotadas neste caderno. Depois disso, desapareceu.
Resultado: o Mosteiro foi reerguido, tornando-se novamente celeiro de muitas
vocações. Ninguém de fora do Mosteiro jamais viu esse espelho, mas alguns
monges dizem tê-lo visto na época. Saíram dizendo que era todo de ouro, cravado
com pedras preciosas... Mas isso só serviu pra ser chamariz de ladrão! O fato é
que o espelho... reflete a verdade da alma da pessoa, sua beleza e sua feiura.
Teria que ficar sob a guarda e posse do monge até sua morte. Somente ele
poderia manuseá-lo. Ah! Importante: o Anjo também lhe deu instruções para
cunhar uma medalha de proteção, pois, diz no caderno, “a realidade espiritual é
ainda mais terrível que a material” e, na quarta página, “a batalha espiritual
é mais real do que aquilo que se pode enxergar”. Essa medalha está colada na
última página. Na ocasião de sua morte, o prior preparou um substituto e
revelou tudo a ele, como deveria ser seu sepultamento e a guarda do espelho e da
medalha. Ele sabia que estava para morrer, antes mesmo de adoecer
repentinamente. Seu substituto foi fiel a todos os detalhes. O monge foi
sepultado juntamente com o espelho, na altura de seu rosto. O caderno e a
medalha ficaram sob a guarda do então prior, até a ocasião de sua morte. Depois
disso, a história foi esquecida...
– Mas, não
entendo... Que ameaças o corpo do prior pode ter sofrido?
– Ah, sim!
Inicialmente ele foi sepultado no cemitério do mosteiro, mas devido às
especulações em torno do valor material do espelho, houve inúmeras tentativas
de saque. Foi então que, o fiel prior substituto também entrou em oração por quarenta
noites, pedindo auxílio naquela situação. Novamente o Anjo apareceu e o
instruiu sobre o quê e como fazer para proteger o lugar: uma placa de pedra com
inscrições em latim e vários símbolos em volta; a mudança do túmulo para o
lugar indicado e, por fim, a proclamação de uma oração de proteção, que
fecharia o lugar. E assim foi feito.
– Porque então
esse sonho me pede para ir até lá pegar o espelho?! O lugar não está fechado?
– Alguém está
tentando pegá-lo primeiro! Alguém que colocará o espelho em perigo. Esse
espelho não pode cair em mãos inimigas, seria um desastre total! Leia o que diz
no caderno, na penúltima página. A chave pra abrir o lugar é a pronúncia da
oração que está escrita na pedra, em latim, mas, quem pronunciá-la precisa ser
do sexo masculino, virgem e sem pecados, caso contrário, atrairá uma maldição,
da mesma forma que a atrairá todo aquele que tentar entrar no lugar, ignorando
a placa. Uma maldição que só será quebrada quando alguém conseguir abrir o local
da maneira correta e pegar o espelho.
– Então é
impossível entrar! Quem não tem pecados?! – Elias está um pouco nervoso.
– Há uma
maneira. Confesse-se ao chegar à cidade e coloque a medalha de proteção até
chegar ao lugar e pronunciar a oração. Depois pode retirá-la e guardá-la de
volta no caderno. Vá até o túmulo, onde há umas pedras em volta e cave. Abra,
retire o espelho e feche novamente.
– Meu Deus!
Não sei se conseguirei fazer isso... Acho que eu não sou a pessoa mais
indicada! – murmura o monge.
– A medalha o
esconde dos anjos. Bons e maus. Como se te ocultasse do “radar” deles. Ela
possui os mesmos símbolos desenhados na placa de pedra. Por isso o local é
invisível para eles.
– Por que o
senhor não vai até lá? – tentando uma maneira de abandonar a missão.
– Não tive
permissão na época e não a tenho agora também, mas pesquisei tudo e te entrego
satisfeito. De certa forma, mesmo sem saber, acabei preparando sua ida. Você
não teria tempo pra isso.
– Por que eu?!
– Elias está a ponto de chorar.
– Não sei.
Deus não costuma dar muita satisfação de Suas escolhas!
– E se eu não
for? – pergunta, em sua última tentativa.
Dom Giovane
olha bem para ele e depois de um breve silêncio, diz:
– Você é livre,
para ir ou não.
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